TOTALMENTE CLARICE LISPECTOR



"Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento."

"Sempre tenho a estranha sensação, embora tudo tenha mudado e eu esteja muito bem agora, de que este dia ainda continua o mesmo, como um relógio enguiçado preso no mesmo momento – aquele".

"Não sei o que fazer do que vivi,tenho medo dessa desorganização profunda. Não confio no que me aconteceu. Aconteceu-me alguma coisa que eu,pelo fato de não a saber como viver,vivi uma outra?!"

"Não me prendo a nada que me defina. sou companhia, mas posso ser solidão. tranqüilidade e inconstância, pedra e coração. Sou abraços, sorrisos, ânimo, bom humor, sarcasmo, preguiça e sono. Música alta e silêncio. Serei o que você quiser, mas só quando eu quiser. Não me limito, não sou cruel comigo! Serei sempre apego pelo que vale a pena e desapego pelo que não quer valer… Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato. Ou toca, ou não toca."

"Como se visse alguém beber água e descobrisse que tinha sede. Sede profunda e velha. Talvez fosse apenas falta de vida: estava vivendo menos do que podia e imaginava que sua sede pedisse inundações."

"Eu fora obrigada a entrar no deserto para saber com horror que o deserto é
vivo, para saber que uma barata é a vida. Havia recuado até saber que em mim a
vida mais profunda é antes do humano - e para isso eu tivera a coragem diabólica
de largar os sentimentos. Eu tivera que não dar valor humano à vida para poder
entender a largueza, muito mais que humana, do Deus. Havia eu pedido a coisa
mais perigosa e proibida? arriscando a minha alma, teria eu ousadamente exigido
ver Deus?
E agora eu estava como diante Dele e não entendia - estava inutilmente de
pé diante Dele, e era de novo diante do nada. A mim, como a todo o mundo, me
fora dado tudo, mas eu quisera mais: quisera saber desse tudo. E vendera a
minha alma para saber. Mas agora eu entendia que não a vendera ao demônio,
mas muito mais perigosamente: a Deus. Que me deixara ver. Pois Ele sabia que
eu não saberia ver o que visse: a explicação de um enigma é a repetição do
enigma. O que És? e a resposta é: És. O que existes? e a resposta é: o que
existes. Eu tinha a capacidade da pergunta, mas não a de ouvir a resposta."


"Mas de mim depende
eu vir livremente a ser o que fatalmente sou. Sou dona de minha fatalidade e, se
eu decidir não cumpri-la, ficarei fora de minha natureza especificamente viva. Mas
se eu cumprir meu núcleo neutro e vivo, então, dentro de minha espécie, estarei
sendo especificamente humana".

"De repente as coisas não precisam mais fazer sentido. Satisfaço-me em ser. Tu és? Tenho certeza que sim. O não sentido das coisas me faz ter um sorriso de complacência. De certo tudo deve estar sendo o que é". 

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